Os parâmetros legais de interpretação e revisão contratual
O Código Civil foi publicado em 2002 e sua vigência teve início em 2003, de modo que todos pudessem conhecer e fazer as adequações necessárias naquilo que fosse preciso, tanto no que dispõe em relação às pessoas quanto às empresas.
No
entanto, algumas disposições sofreram mudanças mais recentes, permitindo a
fruição e salvaguarda de direitos previstos na Constituição Federal.
Neste
texto, vamos comentar um pouco sobre a interpretação e revisão dos contratos,
tema que vem sendo expandido pelas discussões doutrinárias e jurisprudenciais
desde a entrada em vigor do novo Código e tem sido renovado pela legislação
recente, neste caso específico, pela Lei de Liberdade Econômica.
1. Sobre os parâmetros de intepretação contratual
É sabido que o princípio da boa-fé é considerado um dos
princípios norteadores do Código Civil de 2002, podendo ser descrito como um
dever geral de conduta proba e íntegra de todos, sejam particulares, sejam
empresas. E a renovação legislativa num dos artigos que tratam da boa-fé no
Código deve ser analisada com atenção.
O artigo 113 dispõe que a interpretação dos negócios jurídicos
deve ser feita conforme a boa-fé e os usos do lugar da celebração do contrato e
alguns parágrafos foram acrescidos ao dispositivo. Veja-se o texto da lei:
Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme
a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.
§ 1º A
interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que:
I - for confirmado
pelo comportamento das partes posterior à celebração do negócio;
II - corresponder
aos usos, costumes e práticas do mercado relativas ao tipo de negócio;
III - corresponder
à boa-fé;
IV - for mais
benéfico à parte que não redigiu o dispositivo, se identificável; e (
V - corresponder a
qual seria a razoável negociação das partes sobre a questão discutida, inferida
das demais disposições do negócio e da racionalidade econômica das partes,
consideradas as informações disponíveis no momento de sua celebração.
§ 2º As
partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de
lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em
lei.
O parágrafo 1º dispõe que a interpretação deve atribuir o
sentido do negócio jurídico que foi confirmado pelo comportamento das partes ao
longo do cumprimento do contrato, bem como ao que corresponder aos usos,
costumes e práticas do mercado relativos ao negócio que foi celebrado. Também
deve ser interpretado de modo que corresponde à boa-fé e, caso se verifique que
as disposições contratuais foram redigidas por uma das partes, essas devem ser
interpretadas de modo mais benéfico à parte que não as redigiu.
O contrato deve ser interpretado com referência nas demais disposições do contrato
e da racionalidade econômica das partes consideradas as informações
disponíveis. Essa disposição é a mais genérica e conflita com a mínima
interferência sobre o contrato disposta no artigo 421, ao menos aparentemente.
E a ideia de racionalidade econômica é de aplicabilidade curiosa, a se atentar
na jurisprudência que advirá a partir dessa disposição.
É muito difícil estabelecer da qual seria razoável negociação
das partes porque geralmente as dúvidas sobre a interpretação da cláusula
contratual surge em momentos de crise ou de dificuldade de uma das partes em
conseguir honrar o compromisso assumido.
Por fim, há também disposição relativa a adoção pelas partes de
regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos
negócios jurídicos que sejam diversas daquelas previstas em lei, lei esta no
sentido mais genérico possível abrangendo o próprio Código Civil, a lei de
introdução às normas do direito brasileiro, o que causa estranheza. Por um
lado, aqui se permite a adoção de regras
de sistemas jurídicos estrangeiros ou cridas pelas próprias partes, e de outro,
limita-se a interferência dos juízes sobre os contratos com essas reformas
trazidas pela lei de liberdade Econômica. Ou seja, além dos juízes podem
interferir menos no contrato na sua interpretação e revisão, ainda se prevê a
adoção de maneiras variadas de interpretação contratual, o que pode trazer
grandes problemas aos contratantes mais vulneráveis.
2. Sobre a Revisão Contratual
Por sua vez, o artigo 421, foi modificado pela lei de liberdade
econômica e recebeu um complemento, a partir da inclusão do artigo 421-A, que
dispõe especificamente sobre a revisão contratual. Observe-se:
Art. 421. A
liberdade contratual será exercida nos limites da função social do
contrato.
Parágrafo único.
Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção
mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.
Art. 421-A.
Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até
a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa
presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais,
garantido também que:
I - as partes
negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das
cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução;
II - a alocação de
riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e
III - a revisão
contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.
Esse complemento dispõe que as partes em contratos civis e
empresariais são presumidas iguais (ou seja, tem as mesmas condições de
discernimento, de conhecimento dos negócios que estão celebrando) e, portanto,
os contratos são paritários e simétricos, salvo se algum elemento dito aqui
“concreto” não justifique essa presunção. O mesmo artigo dispõe que regime
jurídicos previstos em leis especiais podem afastar essa presunção, como no
caso do direito do consumidor, direito do trabalho, direito administrativo,
entre outros.
Há determinadas garantias a partir da fixação de parâmetros para
interpretação das cláusulas contratuais, bem como pressupostos para revisão ou
para resolução do contrato.
Também deve ser observada a alocação de riscos definida pelas
partes naquilo que as partes aceitaram ao celebrar o negócio e satisfazem seus
interesses. Mais uma vez se prevê que a revisão contratual será excepcional e
limitada, tentando-se coibir a interferência externa daquilo que foi negociado
e definido entre as partes contratantes.
A doutrina tratava com muita cautela desse assunto, pois o
ativismo judicial crescente das últimas décadas ameaça a previsibilidade e
segurança jurídica dos empreendedores e por isso a lei tenta consolidar uma
menor atuação sobre os negócios privados.
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