Fiador na locação
Em alguns momentos da vida, algum amigo talvez já tenha pedido para que você fosse o seu fiador numa locação. E talvez você tenha aceitado. Você sabe dos riscos a que está exposto assumindo essa posição?
Papel do fiador
O fiador é uma pessoa que garante o pagamento de uma obrigação que é devida por outra pessoa, no caso de ela não a quitar. Ou seja, ele assume a responsabilidade de pagar por um contrato que não diz respeito pessoalmente a ele, pois ele não está envolvido no contrato principal, mas está sujeito à cobrança relativo a ele. Consta do art.818 do Código Civil:
Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.
O fiador costuma ser indicado pelo locatário e assina o contrato de locação, não existindo a fiança verbal, por disposição da lei civil, por força do artigo 819 do mesmo Código:
Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva.
Também há que se destacar que o fiador casado deve ter o consentimento do cônjuge, que também deve assinar o contrato, não podendo ser responsabilizado se assim não o fizer no que compete ao seu patrimônio.
O fiador deve ser aceito pelo locador, apontando a lei razões para a recusa legítima do fiador apresentado:
Art. 825. Quando alguém houver de oferecer fiador, o credor não pode ser obrigado a aceitá-lo se não for pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a fiança, e não possua bens suficientes para cumprir a obrigação.
Caso essas condições se alterem no passar do tempo durante a vigência do contrato, o fiador deverá ser substituído, conforme exigência do locador:
Art. 826. Se o fiador se tornar insolvente ou incapaz, poderá o credor exigir que seja substituído.
Riscos do fiador
O fiador, pela regra da lei, é considerado responsável subsidiário, o que quer dizer que só será cobrado depois do locatário provar que não tem meios de realizar o pagamento que deixou pendente. Isso é chamado de “benefício de ordem” e quer dizer exatamente isso: quando o locador aciona o fiador, este pode indicar que o locatário deve ser cobrado antes dele. Assim dispõe o artigo 827:
Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.
Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito.
Todavia, a maioria dos contratos de locação fazem constar expressamente duas cláusulas que impedem essa defesa do fiador: a renúncia expressa ao benefício de ordem e o estabelecimento da responsabilidade solidária.
A renúncia ao benefício de ordem, uma vez constando por escrito do contrato, impede que o fiador chame o locatário na ação de cobrança de aluguel para efetuar o pagamento antes dele.
Já a cláusula de responsabilidade solidária pelo pagamento estabelece que o fiador será considerado devedor solidário ao locatário, o que piora bastante a sua situação, pois ele pode ser cobrado ao mesmo tempo que o locatário no caso desse não ter pago o que devia, e não depois. Isso, sem dúvida, aumenta a chance de o locador receber a quantia, pois pode cobrar de mais pessoas ao mesmo tempo. Veja-se o artigo 828:
Art. 828. Não aproveita este benefício ao fiador:
I - se ele o renunciou expressamente;
II - se se obrigou como principal pagador, ou devedor solidário;
III - se o devedor for insolvente, ou falido.
Evidentemente, o fiador poderá cobrar o ressarcimento do locatário pelo que pagar, o que a lei chama de “sub-rogação”.
Essa é a situação descrita pelo artigo 831
Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota.
Parágrafo único. A parte do fiador insolvente distribuir-se-á pelos outros.
Outro risco, muito mais grave, diz respeito aos bens imóveis do fiador, que podem ser penhorados judicialmente, caso não pague a dívida cobrada do locatário, pois a lei não confere proteção a seus bens como protege o bem imóvel considerado “bem de família” do locatário. Ou seja, caso tudo dê errado na cobrança de valores atrasados e o locatário e o fiador não paguem a quantia determinada em juízo, o “bem de família” do fiador poderá ser tomado e vendido em leilão, enquanto o “bem de família” do locatário não! É uma incoerência da lei, pra dizer o mínimo, mas que exemplifica de maneira dramática o risco de ser o garantidor do contrato.
Para esclarecer um pouco, o “bem de família” é assim considerado quando se tratar do imóvel de propriedade da pessoa na qual ele resida sozinho ou com sua família, e que é protegido contra a penhora judicial numa série de situações. Caso a pessoa tenha mais de um imóvel, geralmente é considerado “bem de família” o de menor valor, salvo se ela tiver registrado algum especificamente como tal, cumprindo uma série de requisitos.
Defesas do fiador
Depois de saber dessas complicações que podem constar do contrato, como o fiador pode se defender em caso de cobrança judicial de aluguel?
A lei civil estabelece uma série de situações nas quais o fiador não poderá ser obrigado a pagar.
Dispõe a lei civil que a obrigação que for considerada nula não é possível de ser afiançada. Assim, se o contrato de locação for nulo, nula será a fiança prestada e o fiador não deverá ser cobrado. É o que estabelece o artigo 824:
Art. 824. As obrigações nulas não são suscetíveis de fiança, exceto se a nulidade resultar apenas de incapacidade pessoal do devedor.
Parágrafo único. A exceção estabelecida neste artigo não abrange o caso de mútuo feito a menor.
O fiador também poderá opor todas as defesas que o locatário possui contra o locador, alegando irregularidade de valores, pagamento já efetuado, compensação de valores.
Art. 837. O fiador pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais, e as extintivas da obrigação que competem ao devedor principal, se não provierem simplesmente de incapacidade pessoal, salvo o caso do mútuo feito a pessoa menor.
Também não será mais responsabilizado o fiador no caso de o locador conceder prazo para o locatário realizar o pagamento sem consentimento, se o locador impedir a cobrança do reembolso do valor pago pelo fiador contra o locatário ou se o locador aceitar objeto diverso como pagamento, conforme disposição do arti.838:
Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:
I - se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor;
II - se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos seus direitos e preferências;
III - se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção.
No caso do locatário ser chamado a pagar o valor antes do fiador, em razão do beneficio de ordem, mas atrasar o pagamento e perder seus bens, o fiador não será obrigado a pagar caso comprove que, na época em que indicou os bens do locatário, este ainda dispunha de bens suficientes para quitar a dívida, por força do art. 839:
Art. 839. Se for invocado o benefício da excussão e o devedor, retardando-se a execução, cair em insolvência, ficará exonerado o fiador que o invocou, se provar que os bens por ele indicados eram, ao tempo da penhora, suficientes para a solução da dívida afiançada.
São situações geralmente controversas, às vezes de difícil comprovação, mas que permitem ao fiador se eximir de pagamentos vultosos.
Exoneração do fiador
O Código civil estipula que o fiador poderá pedir exoneração da garantia que assume a qualquer tempo, se o contrato que assinou não tiver prazo determinado, permanecendo responsável por 60 dias contados da notificação ao locador, conforme se lê do artigo 835:
Art. 835. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante sessenta dias após a notificação do credor.
Contudo, a lei de locações, Lei n.8.245, estipula que, no caso de prorrogação do contrato por prazo indeterminado, o fiador poderá pedir a exoneração ao locador, ficando responsável por 120 dias contados da notificação ao locador, conforme consta do respectivo art.40, inciso X:
Art. 40. O locador poderá exigir novo fiador ou a substituição da modalidade de garantia, nos seguintes casos:
I - morte do fiador;
II – ausência, interdição, recuperação judicial, falência ou insolvência do fiador, declaradas judicialmente;
III- gravação de todos os bens imóveis do fiador ou sua mudança de residência sem comunicação ao locador;
IV - exoneração do fiador;
V - prorrogação da locação por prazo indeterminado, sendo a fiança ajustada por prazo certo;
VI - desaparecimento dos bens móveis;
VII - desapropriação ou alienação do imóvel.
VIII - exoneração de garantia constituída por quotas de fundo de investimento;
IX - liquidação ou encerramento do fundo de investimento de que trata o inciso IV do art. 37 desta Lei.
X – prorrogação da locação por prazo indeterminado uma vez notificado o locador pelo fiador de sua intenção de desoneração, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador.
Parágrafo único. O locador poderá notificar o locatário para apresentar nova garantia locatícia no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de desfazimento da locação
Herdeiros do fiador
Se o fiador vier a falecer durante a vigência do contrato de locação, ele deverá ser substituído, como consta da disposição da lei de locações acima reproduzida. Contudo, se ele falecer quando já havia valores pendentes deixados em aberto pelo locatário, os herdeiros do fiador poderão ser cobrados a pagar esses valores, desde que haja patrimônio suficiente na herança deixada. Tal fato consta do art.836:
Art. 836. A obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a responsabilidade da fiança se limita ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças da herança.
Em caso de dúvida, consulte sempre um advogado de confiança, que pode ajudá-lo a revisar a sua minuta ou elaborar um contrato que preveja todas as condições relevantes ao aluguel do seu imóvel, bem como analisar as melhores condições de negociação, para que todos fiquem seguros ao alugar e satisfeitos com o negócio! Até a próxima!


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