Olá, leitor. Nesse texto vamos abordar a decisão recente do Supremo Tribunal Federal que analisou a aplicabilidade da nova lei de improbidade administrativa, Lei n.14.230 de 2021, relativamente a atos praticados antes de sua entrada em vigor.
Foi uma votação pontuada por diversas controvérsias, e os Ministros divergiam em diversos aspectos, por vezes concordando parcialmente com o Relator, Ministro Alexandre de Moraes, por vezes discordando frontalmente dele. Ao final, foi realizado debate para estabelecer a tese a ser seguida relativamente a quatro aspectos fundamentais da aplicabilidade da nova lei. Vamos a eles!
1. Comprovação do dolo nas condutas de improbidade
Ficou estabelecido que a punição por atos de improbidade deverá ser fundamentada na comprovação da vontade, na intenção do agente em infringir a lei, ou seja, a responsabilização do agente dependerá do dolo.
A nova lei de improbidade estabelece que apenas serão responsabilizados os agentes que praticarem intencionalmente as infrações, ao contrário da lei anterior, que permitia a punição por atos praticados culposamente, ou seja, sem a intenção deliberada.
Dessa forma, deve sempre ser avaliada, para que haja punição, a intenção do agente nas condutas investigadas. Caso não haja tal comprovação, não será possível a punição.
2. Irretroatividade da ausência de responsabilidade por ato culposo não julgado em definitivo
Como já comentado acima, a nova lei de improbidade estabelece que os atos de improbidade, para que sejam puníveis, devem compreender uma atitude intencional dos agentes, portanto, uma conduta dolosa.
Mas e quanto aos casos de improbidade que já tiverem sido sentenciados e cujas punições estiverem sendo aplicadas? E quanto aos casos já sentenciados e já punidos, haveria direito à pedir indenização ou restituição?
O STF firmou o entendimento de que a revogação da modalidade de atos de improbidade praticados de maneira culposa não interferirá nos casos já decididos. Isso, evidentemente, quer dizer que não se aplicará a excludente de responsabilização que a nova norma trouxe nos casos em que a decisão punitiva já tiver transitado em julgado.
Não importará, inclusive, se as punições continuam a ser executadas na vigência da nova lei.
Tal entendimento partiu da compreensão de que a lei de improbidade administrativa tem natureza civil, e não penal, de modo que a edição de lei posterior mais benéfica não permite tal retroatividade, abrangendo casos anteriores e já decididos, uma vez que respaldados pela coisa julgada, consagrada pela Constituição Federal de 1988.
3. Exceções da irretroatividade
Os Ministros concordaram, entretanto, que a nova lei deverá ser considerada pelos juízes no momento em que estiverem julgado atos de improbidade praticados antes da entrada em vigor da nova lei. Desse modo, só poderá haver responsabilização dos agentes que tiverem praticado condutas de improbidade na modalidade dolosa.
Tal tese se sustenta no fato de que, caso os juízes julgassem os atos de improbidade culposos de acordo com a lei revogada, estariam sentenciando com base em norma legal inexistente, o que é incabível.
4. Sobre os novos prazos prescricionais
A nova lei de improbidade traz novos prazos de prescrição que interferem na responsabilização dos agentes e poderiam gerar anulações de processos caso considerados válidos para sentenças já transitadas em julgado.
Os Ministros entenderam que não se pode aplicar tais prazos novos em casos já decididos em definitivo, portanto, são irretroativos.
Os marcos temporais de prescrição, contudo, devem ser observados a partir da publicação da nova lei, para os casos ainda não julgados em definitivo.
Dessa maneira, tentou-se resguardar a segurança jurídica e a efetividade das punições já aplicadas com base no regramento anterior, de modo a se respeitar o devido processo legal e a coisa julgada, essenciais para a preservação do Estado Democrático de Direito.
Esse aqui é o texto que reúne as teses confirmadas pelos Ministros no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo, ARE 843989:
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 1.199 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para extinguir a presente ação, e, por maioria, o Tribunal acompanhou os fundamentos do voto do Ministro Alexandre de Moraes (Relator), vencidos, parcialmente e nos termos de seus respectivos votos, os Ministros André Mendonça, Nunes Marques, Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Na sequência, por unanimidade, foi fixada a seguinte tese: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". Redigirá o acórdão o Relator. Presidência do Ministro Luiz Fux. Plenário, 18.8.2022.
Clique aqui para ler mais textos sobre a nova lei de improbidade administrativa!
Clique aqui para ter acesso à página do STF sobre esse julgamento:
https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4652910
Até a próxima!

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